5.10.21

Cine-Estudio 222 - Catedral do Cinema Independente

Continuando pela cidade de Lisboa, chego à Avenida Praia da Vitória, nº 37, junto à Praça do Saldanha, onde ainda se encontra (pelo menos a marquise) o Cine Estudio 222.

Este espaço abriu as suas portas em Agosto de 1979, inserido numa pequena galeria comercial com poucas lojas e em forma de corredor, que dava acesso às escadas que conduziam ao cinema. Mais um exemplo de uma sala de cinema que ficava numa cave de um prédio habitacional, tão em voga na década de 1970. O filme inaugural foi "Uma Razão para Viver" (1978), realizado por Joseph C.Hanwright e interpretado por Burt Young.

Tinha uma particularidade urbana: o painel que se sobressaía da fachada e que divulgava em letras garrafais o seu nome.



Interior da sala (cortesia de David Ferreira no grupo de Facebook "Cinemas do Paraíso")

Interior da sala (cortesia de David Ferreira no grupo de Facebook "Cinemas do Paraíso")

Interior da sala (cortesia de David Ferreira no grupo de Facebook "Cinemas do Paraíso")



Era um espaço de pouca relevância comercial, apesar da sua localização bastante central, devido ao facto de estar muito associado à exibição de filmes de Bollywood durante muitos anos, muito direccionado para um determinado nicho de público.

Quando este espaço surgiu em 1979, funcionou como um cinema normal, e até teve sucessos de exibição, como o filme "Kramer Contra Kramer", que esteve em cartaz neste cinema durante 27 semanas. Contudo, com o aparecimento dos multiplexes, a gerência foi obrigada a criar uma filosofia diferente, porque não dava para competir com as grandes salas. Importava criar uma verdadeira alternativa, de modo a cativar os espectadores.

Para o gerente deste cinema, Dhimante Cundanlal, a sua designação surgiu por acaso, não se sabendo bem como apareceu. Poderia ter alguma conotação com o número de lugares da sala. 

Quis diferenciar este cinema de outros, através de ciclos de filmes. Também foram importantes as parcerias estratégicas, nomeadamente a efectuada com a Associação "Zero em Comportamento", responsável pelo bem sucedido IndieLisboa, entre 2001 e 2003. Esta entidade era responsável pela programação da sala nos dias úteis. Esta parceria foi frutifera e este cinema teve lotações esgotadas com os ciclos a cargo desta associação, chegando perto dos 80.000 espectadores. 

É de salientar que, à 4ª Feira, eram exibidas curtas metragens.

Com uma comunicação eficaz, que incluía uma apresentação presencial antes do filme se iniciar, e com ciclos temáticos muito originais (que voltaram a exibir filmes que já não era, vistos há muitos anos ou que eram inéditos), esta associação transformou este cinema num local de culto, que captava a atenção de cinéfilos de todas as idades, especialmente os universitários que alargavam o seu conhecimento sobre a história do Cinema. No entanto, a partir de 2003, já era vísivel a degradação desta sala e a vontade desta entidade em procurar outras parcerias e seguir com outros projectos, acabando por sair deste cinema.

A gerência era responsável pela programação ao fim-de-semana, constituída por filmes indianos, na sua versão original e que vinham directamente de Londres. Alguns já tinham legendagem em inglês. Este cinema tentou agregar no mesmo espaço as 3 comunidades indianas que residiam em Lisboa (hindu, muçulmana e ismaelita) e, desde o final da década de 1990 e o início da década de 2000, que funcionou como ponto de encontro e de divugação da cultura indiana. Assim, a gerência poderia comprar os filmes, fazer a sua legendagem e projectá-los para uma sala pública.

Este cinema funcionou, até 2005, quando fechou portas para serem feitas obras na cobertura do telhado, processo que ficou parado (pelo menos até 2012) à espera da decisão do tribunal sobre o apuramento de responsabilidades. Sem estas obras, a C.M.Lisboa não emitiria a licença de utilização do espaço. 

Actualmente, quer o cinema, como a galeria comercial encontram-se encerrados (pelo menos, conforme a imagem seguinte).


Fontes:

- SILVA, Ricardo Oliveira (2012) "O Cinema e a Televisão Sob o Signo da Identidade: Bollywood e as Fronteiras da

Modernidade Indiana, na Cidade de Lisboa". Departamento de Antropologia do ISCTE - Instituto Universitário de Lisboa.

- https://museudoscinemas.wordpress.com/2021/04/05/cine-estudio-222-1978-2003/

- https://www.facebook.com/groups/sala9?locale=pt_PT

- https://www.ruadebaixo.com/cine-estudio-222.html

- https://jornalismoaudiovisual.wordpress.com/2013/02/12/os-cinemas-que-lisboa-nao-ve/estudio-222/

- http://industrias-culturais.blogspot.com/2006/12/os-pequenos-centros-comerciais.html

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