20.12.13
Cinemas do Paraíso: Odivelas
Hoje fico-me por casa e vou falar da terra que me acolheu há 44 anos...sim, vou falar de Odivelas, mais concretamente dos espaços cinematográficos que possuiu e ainda possui.
A cidade de Odivelas, que há 15 anos se tornou em Concelho, não virou a cara à maravilha que inundou o país no inicio do Séc. XX... o cinema.
Graças à Sociedade Musical Odivelense (SMO), foi iniciado o processo que iria dar lugar ao primeiro cinema nesta cidade na década de 1920.
As primeiras projecções cinematográficas ocorreram numa sala cedida pelo Clube "Os Passarinhos", com sessões pontuais e privadas. Dessa altura nada ficou registado sobre os filmes que foram exibidos, mas dessas primeiras experiências concluiu-se que o cinema era fascinante para o público e altamente rentável como actividade.
O cinema vai ganhando espaço na SMO até se tornar na sua principal actividade na década de 1930, lugar que ocupará até à década de 1970.
Em 1931 e com a edificação de sede própria, o cinema torna-se numa actividade regular com a exibição de filmes como A Maria Papoila, A Aldeia da Roupa Branca ou O Ditador.
Em 1936 a exploração do Salão de Festas como cinema é autorizada pelo Ministério das Obras Públicas e Comunicações, fazendo com que o projecto do Cineteatro ganhasse consistência.
As exibições feitas na sede complementavam-se com as sessões de cinema ao ar livre, que ocorriam durante o Verão. Estas sessões ocorriam inicialmente em espaços cedidos temporariamente para a realização da animação de Verão. Um desses primeiros locais foi o quintal do Sr. Antunes Branco, disponibilizado à SMO em 1938.
Em 1956, o cinema ao ar livre deixa de ser exibido em vários locais devido à negociação feita com o Sr. Valentim Duarte das Neves, proprietário de um local que ficava na Rua do Souto. Seria nesse local que seria edificada a Cine Esplanada, inaugurada em Junho do mesmo ano, e que daria ao cinema ao ar livre um espaço próprio.
Só em 1967 é que se atribui a licença do titulo definitivo da exploração da esplanada como cinema pela Secretaria Nacional da Informação, Cultura Popular e Turismo, passando os odivelenses a dispor de uma sala ao ar livre que poderia albergar 500 espectadores.
Até à década de 1980, a SMO dependia da actividade cinematográfica em termos económicos, mas isso se alteraria com o aparecimento de novos espaços concebidos de raiz para a actividade cinematográfica que iriam oferecer aos odivelenses uma programação mais cuidada e actualizada. Tanto o Cineteatro como a Cine Esplanada da SMO não aguentaram a concorrência e acabaram por findar a sua actividade, uma das mais lucrativas e populares da história desta entidade.
No Diário da Assembleia da República de 28 de Outubro de 1987 no Projecto de Lei nº 55/V que tratava da elevação da vila de Odivelas a cidade, consta que nessa altura Odivelas possuía quatro salas de espectáculos: Sociedade Musical Odivelense, Cine Esplanada de Odivelas, Odivel Cine e Cinema Oceano.
Em 1980, surgiu o primeiro centro comercial em Odivelas, de seu nome C.C. Kaué, localizado na Rua Major Caldas Xavier. Nesse estabelecimento, existia um cinema de seu nome Cine Odivel. Durante anos foi essencialmente um cinema de reprise, mas também assistiu-se a algumas estreias como a do filme Titanic em 1998, que foi um autêntico sucesso entre os odivelenses. A sala não era muito grande, mas era agradável...um pouco vintage e datada devido ao aparecimento de novos centros comerciais com salas de cinemas mais modernas e melhor equipadas. O Cine Odivel fechou as portas em 2004, mas graças à obstinação do empresário e gerente do C.C. Kaué, de seu nome Raul Melo, foi possível recuperar este espaço e transformá-lo num auditório designado de Kaué Auditório D. Dinis, inaugurado em 2011.
Em 1984, surgiu o segundo centro comercial em Odivelas, de seu nome Centro Comercial Oceano na Av.ª D. Dinis.
Constituído por 75 lojas distribuídas por vários andares, este centro era magnânimo na época e teve direito ao seu próprio espaço cinematográfico, designado de Cinema Oceano. Recordo-me perfeitamente de ir a uma sessão de cinema pela primeira vez, inserida numa turma de crianças endiabradas, neste cinema. Até me lembro muito bem do filme: Fievel, um conto americano. A sala era enorme e o hall e a zona do bar eram muitos espaçosos e iluminados. Era sem dúvida uma sala muito interessante e vistosa na época, mas também não esteve muito tempo aberta. Depois do seu encerramento, a sala transformou-se numa loja de roupa (lembram-se da Barcelona 92?) e, actualmente, é ocupada pela Igreja Evangélica Assembleia de Deus Pentecostal.
No inicio do novo século, surgiu o terceiro centro comercial em Odivelas designado de Centro Comercial Odivelas Parque (actual Strada Shopping + Fashion Outlet) na Estrada da Paiã. No seguimento de outros centros comerciais modernos que foram aparecendo pelo país fora, Odivelas teve direito ao seu gigantesco centro comercial com múltiplas salas de cinemas (neste caso são seis) com a designação de Zon Lusomundo Cinema. Apesar da modernidade e do conforto, estas salas não têm metade do encanto de outras salas de cinema que existiram em Portugal e muito menos em Odivelas.
Last but not least...
A freguesia da Póvoa de Santo Adrião também teve um cinema designado de São José, localizado na Rua Padre José Anchieta, n.º 16.
Durante o seu período de actividade teve um relativo sucesso, até encerrar por volta de 1990. Esteve desactivado durante vários anos, até que, em 1993, foi comprado e reabilitado pela Câmara Municipal de Loures, para servir a população com um espaço cultural, passando a ser um Auditório Municipal.
Até 1998, foi utilizado para albergar diversos eventos, desde espectáculos musicais a sessões de cinema. Actualmente, encontra-se encerrado sem previsão de quando será novamente utilizado.
A freguesia da Pontinha também teve um pequeno cinema, que também já desapareceu. A sua designação era Cine União da Pontinha. Situava-se na Rua do Funchal, nº 24 A.
A freguesia da Pontinha também teve um pequeno cinema, que também já desapareceu. A sua designação era Cine União da Pontinha. Situava-se na Rua do Funchal, nº 24 A.
Existe pouca informação sobre este cinema, mas, como curiosidade, os cartazes dos filmes que estavam em exibição neste local eram colocados na parede do restaurante "Velho Mirante" (situado junto à farmácia na entrada da Pontinha). Na época exibia dois filmes, e tinha filas numeradas da AA à P, que era a melhor e a mais cara, porque ficava em cima de um estrado, o que permitia uma boa visualização. Debaixo do ecrã, situava-se um pequeno bar.
Cartaz de cinema - Diário de Lisboa (24.04.1976) |
Atualmente, presume-se que seja uma oficina automóvel.
Fontes:
http://cinemaaoscopos.blogspot.com/2014/08/sao-jose-povoa-de-sto-adriao.html
http://www.dorl.pcp.pt/images/odivelas/autarquicas_2017/PSA_Auditorio_Municipal.pdf~
http://www.dorl.pcp.pt/images/odivelas/autarquicas_2017/PSA_Auditorio_Municipal.pdf~
https://arquivos.rtp.pt/conteudos/plano-para-salvar-a-crise-nos-cinemas/
9.12.13
Cinemas by Night
Depois de um passeio noturno por Lisboa, imbuída de um espirito natalício que se encontra espalhado por toda a cidade, resolvi partilhar com os ilustres visitantes deste blogue algumas fotografias que tirei a alguns cinemas... aproveitando o encanto da noite e das luzes de Natal.
Espero que gostem!
Cinema São Jorge - Avenida da Liberdade
Cinema Condes (atual Hard Rock Café) - Praça dos Restauradores
Interior da Estação do Rossio (antigo Cinema Terminal) - Rossio
Teatro Politeama - Rua Portas de Santo Antão
Animatógrafo do Rossio - Rua dos Sapateiros (Arco da Bandeira)
2.12.13
Visita à era de ouro dos animatógrafos em Lisboa
Depois da história publicada sobre o Salão Fantástico (um dos primeiros animatógrafos que surgiu em Lisboa no inicio do século XX), continuei a pesquisa sobre mais alguns espaços esquecidos de Lisboa que tiveram a sua importância histórica, principalmente na área cinematográfica.
O primeiro animatógrafo a ser redescoberto é o Salão Avenida, inaugurado em 1898 na Avenida da Liberdade, um pouco acima da Rua das Pretas.
O seu aparecimento deveu-se ao capitalista Alexandre Mó (um dos homens mais respeitados da alta sociedade lisboeta), responsável pelo aparecimento da empresa que explorava as exibições do animatógrafo do Coliseu dos Recreios. Também já se encontrava ligado ao mundo do espectáculo graças ao auxilio financeiro que prestou na construção do Teatro Avenida, inaugurado em 1888 na Avenida da Liberdade. Contudo, um desentendimento com o seu sócio Manuel Costa Veiga fez com que ele se aventurasse sozinho e investisse numa nova sala exclusiva para sessões cinematográficas.
Essa aventura foi o surgimento do Salão Avenida que teve uma existência curta, encerrando um ano depois de ter sido inaugurado. O seu edifício foi depois reutilizado para ser o local do depósito de água das Lombadas (ver fotografia), a sede da Aero-Portuguesa e, mais tarde, o Café Avenida. Actualmente alberga um conjunto de escritórios, mas ainda mantém a fachada original.
A próxima paragem leva-nos à zona do Chiado (que juntamente com as zonas do Rossio e Restauradores eram as mais privilegiadas no surgimento de animatógrafos), mais concretamente à Rua Nova do Almada, onde se situa um dos edifícios mais famosos da cidade...os Armazéns do Chiado. Perguntarão...porquê que este edifício está a ser mencionado neste blogue? Muito simples...este edifício também albergou um animatógrafo.
Em 1907 um senhor chamado Raul Lopes Freire (filho de um respeitado comerciante lisboeta) decidiu inaugurar um animatógrafo, depois de ter assistido à exibição de filmes no Coliseu dos Recreios. Esta sua paixão pelo cinema fez nascer o Salão Chiado (conhecido também como o "Animatógrafo dos Armazéns do Chiado"), localizado no interior dos Armazéns do Chiado.
O espaço, dirigido pelo austríaco Francisco Stella, era pequeno e modesto mas tinha uma boa afluência popular, o que lhe permitiu manter uma estável situação económica. Exibia fitas "para todos", com cançonetas e duetos nos intervalos, mas também fitas "para homens" em determinados dias.
Contudo, como homem de negócios que era e entusiasmado com o sucesso deste salão, Raul Lopes Freire decidiu adquirir uma sala mais ampla e cómoda. Esse desejo levou ao surgimento do Salão Central na zona dos Restauradores em 1908, mas a afluência do público ao Salão Chiado mantinha-se inalterável.
No entanto, Lopes Freire resolveu findar a curta mas brilhante carreira do Salão Chiado em 1908, para se dedicar à exploração mais rentável do novel Salão Central.
No mesmo ano de 1907 foi inaugurado outro espaço que também seria um animatógrafo. Designou-se de Teatro Moderno e localizava-se na Rua Álvaro Coutinho, junto à Avenida Almirante Reis. Esta inauguração deveu-se aos esforços do antigo actor Santos Júnior e a referida casa de espectáculos era ampla e bonita, permitindo a realização dos mais diversos espectáculos. A partir de 1910 este espaço começou a exibir cinema, função esta que durou vários anos a par da teatral. Em 1916, este espaço funcionava como um cine-teatro o seu programa incluía a projecção de filmes, variedades e circo.
No entanto em 1918, este espaço findava as suas actividades, sendo vendido e demolido. O seu pano de boca (na época de notório sentido artístico) adquirido por um ferro velho, foi comprado por uma empresa teatral da época para ser utilizado no seu próprio recinto de espectáculos.
Outro espaço que também se transformou em animatógrafo, e que ficava bem próximo do Teatro Moderno (na antiga Travessa do Borralho, actual Rua Francisco Lázaro), foi o Teatro Salão dos Anjos, vulgo Teatro do Borralho.
O seu aparecimento ocorreu no inicio do Século XX e foi construído para ser essencialmente um teatro, apesar das suas modestas instalações. Em 1914, este espaço começou a ter sessões de cinema, mas viria a encerrar na década de 1930, tornando-se mais tarde na sede do Lisboa Ginásio Clube.
Em 28 de Março de 1880, o jornal "Diário de Noticias" descrevia com pompa e circunstância a inauguração de uma casa de espectáculos designada de Teatro do Rato. Este novo espaço era descrito como bonito, decente, com ares de elegância despretensiosa, possuidor de um salão de sofás estofados, de ouvreuses para abrir os camarotes e elogiar as senhoras, de uma boa iluminação que davam relevo às alegres decorações, de 500 lugares e de uma razoável orquestra.
Este popular mas esquecido teatro situava-se no pátio da antiga Quinta do Ferreira (terreno que pertencera à Fabrica das Sedas), propriedade então do Marquês de Palavicini, com entrada pelo Largo do Rato que sobreviveu à passagem do tempo.
Contudo, a sua existência foi atribulada. Em 1881 encerrou durante alguns meses, reabrindo depois com a companhia organizada por Salvador Marques, da qual fazia parte a actriz Adelina Abranches. Os preços da plateia variavam entre os 100 réis e os 300 réis, os camarotes de 1ª ordem entre 1$200 e 1$500 e as frisas entre 1$000 e 1$200 réis. Este preçário era bem mais acessível do que os praticados nos elitistas São Carlos e Trindade. Mas este pormenor não era o único que diferenciava este teatro dos outros. Também foi importante o repertório que modelou o auditório popular deste pequeno teatro. Passaram por este espaço actrizes célebres como Palmira Bastos, Sofia Santos e Filomena Calado. Este popular mas modesto teatro foi palco para a estreia e despedida de grandes actores durante a sua curta e atribulada existência.
Até 1906 este teatro era gerido pelo actor Santos Júnior, até que um incêndio devorou a sala de espectáculos. As chamas também consumiram a barraca do Bazar Tourada, que na época estava armada junto do teatro. Reza a história que o animatógrafo passou por este espaço em 1910, embora de uma forma momentânea.
Em 1907 a zona do Chiado voltou a ser agraciada com o surgimento de um novo salão, que iria aderir à grande moda da época que era o animatógrafo. Este espaço designado de Salão São Carlos localizava-se na Rua Paiva de Andrade, junto ao edifício da Casa Ramiro Leão e perto do Palácio Pinto Bastos.
Na época era considerada uma bela sala com todas as comodidades e segurança, possuindo diversas salas de espera e uma enorme sala de buffet. Os donos não pouparam a meios para equipar este espaço com o melhor equipamento de projecção existente na altura.
Sessões variadas realizavam-se todas as noites das 19 às 23 horas. Aos Domingos e dias santificados existiam matinés a partir às 13h30.
Os preços eram razoáveis, apesar da utilização de um aparelho caro como o Electro-Kino. Assim, a "geral" tinha o preço de 60 réis e as "cadeiras" custavam 110 réis. A publicidade a este espaço era feita através de panfletos que eram distribuídos pela população, que assim ficava a saber quais eram os espectáculos que iriam ser exibidos no referido salão.
Contudo o estado de graça durou pouco tempo, mais concretamente um ano e meio. O seu encerramento ocorreu devido ao aparecimento de outras salas mais amplas e modernas espalhadas pela cidade.
O Salon Rouge foi mais um espaço lisboeta a usufruir da experiência do animatógrafo, tendo sido inaugurado em 1908 na Rua Dom Pedro V entre o Bairro Alto e o Príncipe Real. A sua designação era muito pomposa, mas a sua fachada era tudo menos isso. Era um salão improvisado sem muita comodidade ou requinte, mas que conseguiu permanecer aberto durante quase duas décadas.
Na época esta sala, a partir da meia noite, exibia fitas pornográficas em sessões denominadas Sessões para Ingénuos: Fitas d'alta potência. Estes filmes eram mudos e de curta duração e provavelmente de origem francesa, visto que a França (a par dos EUA) foi uma das precursoras da pornografia cinematográfica. Foram exibidos filmes com títulos interessantes como Espectáculo Imprevisto (natural), Aventuras no Campo (desenjoativo), Justina a tomar banho (preparação), Duas Amigas (Hoje há fressura), Pintor Modelo ( Principia a erecção), etc.
Graças ao sucesso destas exibições bastante acaloradas, o Salon Rouge chegou a ter filiais como o Chalet Rotunda na Feira de Agosto. Contudo este espaço viria a encerrar em 1926 e converter-se-ia numa garagem.
Em 1909 abriu ao público o "Grande Animatographo de Alcântara", que anos mais tarde (quando passou para as mãos do publicista Ludgero Viana) ganharia a designação de Animatographo de Alcântara.
Localizado na famosa Avenida 24 de Julho, era considerado na altura um dos mais vastos recintos da cidade embora as suas instalações ficassem aquém dessa vastidão. Mas isso não impediu que tivesse um público fiel, com sessões à 2ª feira, 4ª feira e Domingo.
Este espaço (também conhecido como Salão Alcântara) ardeu em 1918 num violento incêndio causado por um curto circuito, o que valeu ao seu empresário (responsável pela exploração da sala) um valente prejuízo, visto que ele não tinha nada coberto pelo seguro. No entanto a propriedade (que pertencia ao industrial J. Lino) que abrangia o terreno e o imóvel estava coberta pelo seguro. Assim sendo no final desse ano foram iniciadas obras de reconstrução feitas em tempo recorde, permitindo a reabertura deste espaço público no inicio de 1919.
Infelizmente este espaço só duraria mais três anos, encerrando a sua actividade em 1922. O edifício foi desaparecendo com a passagem do tempo e, actualmente, só existe uma fachada em vermelho de um espaço que outrora marcou significativamente o meio social lisboeta.
Fonte:
ACCIAIUOLI, Margarida, Os Cinemas de Lisboa – Um fenómeno urbano do século XX, Lisboa, Editorial Bizâncio, 2012
RIBEIRO, M. Félix, Os mais antigos cinemas de Lisboa, 1896-1939, Lisboa, Instituto Português de Cinema/Cinemateca Nacional, 1978
http://restosdecoleccao.blogspot.pt/2012/11/cinematografos-e-animatografos.html
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http://www.dn.pt/gente/interior.aspx?content_id=1322759
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