De regresso à cidade de Lisboa, vou falar sobre o "piolho" que existiu no Bairro do Alto do Pina, de seu nome Max Cine.
Segundo Ribeiro (1978), o Bairro do Alto do Pina, um dos mais densamente habitados de Lisboa, esteve durante muito tempo sem uma sala de cinema que proporcionasse entretenimento aos seus habitantes. Foi apenas em 1929 que essa necessidade foi atendida, quando uma empresa construiu um salão cinematográfico na Rua Barão de Sabrosa. A partir de 14 de setembro desse ano, os moradores deste bairro finalmente tiveram acesso a uma programação diversificada de filmes no novo cinema designado Max Cine. O nome foi escolhido em homenagem a Max Linder, uma das figuras mais importantes do cinema nos seus primórdios, conhecido como uma das primeiras grandes estrelas internacionais.
Max Linder (1883-1925) |
Este cinema foi projectado pelos engenheiros Jacinto Bettencourt e Deolindo Vieira, que também estiveram responsáveis pela execução das obras. O cinema destacava-se pela sua simplicidade e acolhimento, oferecendo 700 lugares confortáveis distribuídos pela plateia, balcão e camarotes-balcão. Uma das características peculiares da sala era a cabine de projecção, que, tal como no Cinema Olímpia, estava isolada da sala principal, localizada um pouco fora do edifício.De acordo com Acciaiuoli (2012), a sua arquitectura possuía elementos que faziam lembrar um pequeno "templo". Essa característica arquitectónica pode ter facilitado a sua conversão em igreja, quando em 1968 o edifício foi adquirido pela Paróquia de São João Evangelista.
Fachada do Max-Cine (©️ Lisboa de Antigamente, 2017) |
Fachada do Max-Cine (©️ Restos de Colecção, 2016) |
O Max Cine possuía uma notável semelhança com outros cinemas lisboetas da época, como o Cinema Palatino em Alcântara e o Salão Portugal na Ajuda. Todos estes edifícios exibiam elementos decorativos com inspirações teatrais e seguiam uma organização espacial comum nos teatros: incluíam um palco, uma plateia, balcões e camarotes, frequentemente complementados por um buffet no balcão, lustres decorativos no tecto e fotografias de actores nos átrios ou no interior das salas. Essa versatilidade arquitectónica era muitas vezes imposta pela legislação da época, que exigia que os recintos fossem projectados de modo a permitir tanto espectáculos teatrais quanto cinematográficos. Dessa forma, a organização interna dos cinemas de bairro tendia a ser bastante semelhante, com poucas diferenças notáveis. O que diferenciava este cinema de outras salas, como o Salão Portugal ou o Royal Cine, era sobretudo o conforto que cada um oferecia aos seus frequentadores e o grau de ornamentação que marcava as fachadas dos edifícios.
Segundo Aurélio (2016),no seu blogue "Lisboa de Antigamente", a revista "Cinéfilo" em 1931 noticiou que este cinema concedeu a todos os seus leitores e compradores o desconto de 50% no valor do bilhete de entrada em todos os lugares e espectáculos, às 4ª feiras.
Max-Cine na Revista "Cinéfilo" de 1930 (©️ Restos de Colecção, 2016) |
Programa de 10 de março de 1935, da colecção de Carlos Caria (©️ Restos de Colecção, 2016) |
Bilhete de 13 de novembro de 1961, da colecção Carlos Caria (©️ Restos de Colecção, 2016) |
Ribeiro (1978) afirma que, embora o Max Cine fosse predominantemente um cinema de "reprise", ou seja, dedicado à exibição de filmes já lançados, em algumas ocasiões serviu também como cinema de estreia, como mostram alguns dos seus anúncios da época. Após cerca de 40 anos de funcionamento, a empresa Max Cine, Lda., proprietária do imóvel, decidiu vendê-lo. A compra foi realizada pela Paróquia de São João Evangelista, e não pelo Patriarcado de Lisboa, como se chegou a afirmar. A escritura de venda foi oficializada a 1 de maio de 1968. A paróquia, após algumas adaptações, transformou o edifício num templo para servir a extensa comunidade da região.
Max-Cine encerrado em 1967 (©️ Restos de Colecção, 2016) |
Igreja São João Evangelista (©️ Restos de Colecção, 2016) |
Fontes:
- ACCIAIUOLI, Margarida, Os Cinemas de Lisboa – Um fenómeno urbano do século XX, Lisboa, Editorial Bizâncio, 2012.
- RIBEIRO, M.F. Os mais antigos cinemas de Lisboa, 1896-1939. Lisboa: Instituto Português de Cinema : Cinemateca Nacional, 1978
- https://restosdecoleccao.blogspot.com/2016/02/max-cine.html;
- https://lisboadeantigamente.blogspot.com/2017/01/max-cine-o-piolho-do-alto-do-pina.html.
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