De volta a Lisboa, vou recordar um pequeno cinema que existiu na cosmopolita Avenida Guerra Junqueiro, n.º 14... de seu nome STAR.
Na década de 1960, a lei permitiu que edificios de habitação pudessem incluir outros espaços, com fim distinto, nomeadamente salas de cinema. O Arqt.º Henrique V. de Figueiredo conseguiu colocar em prática esta intenção, ao traçar um bloco de apartamentos e uma sala de cinema, que se situava na cave do prédio, embora a entrada fosse feita no rés-do-chão. O projecto contemplava, igualmente, um átrio, ao nível da rua, e dele se descia para a sala através de uma escadaria, carregada de mistério, que conduzia o espectador para um espaço pouco visível. No exterior, uma enorme caixa de alumínio e vidro assinalava a presença do recinto, bem como um lettering com o nome do cinema. Foi assim que surgiu o Estúdio 444 em 1966, precedido pelo Cinema Mundial em 1964, o Cinema Vox em 1968, o Cinebolso em 1975, o Cinema Nimas em 1975, o Cine Estúdio 222 em 1979, o Cinema Zodíaco em 1979, bem como o cinema Star em 1975.
Este cinema foi inaugurado a 9 de dezembro de 1975, sob a direcção do produtor cinematográfico António Maduro, com a ante-estreia do filme "O Gato, o Medo, o Rato e o Amor" do realizador Claude Lelouch. Na época, foi considerado como um espaço espectacular: "(...) onde apetece ir somente paras lá estar, tal é o seu requinte, conforto e bem-estar que proporciona (ao corpo, aos olhos e aos sentidos)".
A sua inauguração foi um evento que reuniu a velha familia do cinema em Portugal, algo que se tinha perdido com o advento do 25 de abril de 1974.
Inauguração do Cinema Star (Revista "Cinema 15", 02.01.1976) |
Publicado no suplemento "Sete Ponto Sete", do Diário de Lisboa de 08.05.1976 |
Cinema Star - 1977 (Arquivo Municipal de Lisboa) |
Cinema Star - 1977 (Arquivo Municipal de Lisboa) |
Cinema Star - 1977 (Arquivo Municipal de Lisboa) |
De acordo com Óscar Casaleiro, autor do excelente blogue "Museu dos Cinemas" e assíduo frequentador deste cinema, se houvesse um campeonato das salas de cinema mais confortáveis, esta seria a vencedora. As poltronas eram macias e repletas de conforto, tornando-se na imagem de marca deste cinema. A entrada era muito ampla e possuía uma escadaria de acesso à sala de cinema, que ficava no piso inferior. Um painel promocional circundava a zona superior do cinema, anunciando o filme, as horas das sessões e o número de semanas que o filme estava em cartaz. Era inegável... quem passava por aquela avenida, sabia que existia ali um cinema.
Destaca-se, igualmente, a boa inclinação, a visibilidade e a decoração do tecto, constituído por pedaços de várias formas suspensas, que conferiam à sala uma coerência estética belíssima.
Houve diversos filmes que fizeram longa carreira de bilheteira neste cinema, nomeadamente: "O Hotel da Praia" (15 semanas em 1978), "O Segredo de Fedora" (16 semanas em 1979), "Um Casamento Muito Original" (17 semanas em 1980), "O Meu Tio da América" (16 semanas em 1981), "Uns... e Outros" (41 semanas em 1981/1982), "Os Deuses Devem Estar Loucos" (32 semanas em 1982/1983), "A Educação de Rita" (21 semanas em 1984), "Gente Gira" (23 semanas em 1984/1985), entre outros. Também foram exibidos neste cinema, filmes como "Nove Semanas e Meia", "Caça ao Outubro Vermelho", "Ghost - O Espírito do Amor", "O Silêncio dos Inocentes" e "Thelma e Louise".
Bilhete de 11.01.1976 (cortesia de Carlos Caria, membro do grupo do Facebook "Cinemas do Paraíso" |
Fontes:
ACCIAIUOLI, Margarida, Os Cinemas de Lisboa – Um fenómeno urbano do século XX, Lisboa, Editorial Bizâncio, 2012
Diário de Lisboa de 08.05.1976
Revista "Cinema 15" de 02.01.1976, p. 30
https://museudoscinemas.wordpress.com/2020/11/02/cinema-star-1977-1992-o-rei-do-conforto/
https://museudoscinemas.wordpress.com/2023/01/09/o-fim-do-cinema-star/
https://arquivomunicipal3.cm-lisboa.pt/xarqdigitalizacaocontent/PaginaDocumento.aspx?DocumentoID=3595026&AplicacaoID=1&Pagina=1&Linha=1&Coluna=1
https://arquivomunicipal3.cm-lisboa.pt/xarqdigitalizacaocontent/Imagem.aspx?ID=4777309&Mode=M&Linha=1&Coluna=1
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